Caravelas foi fundada em 1503, sendo uma das mais antigas ocupações da colônia, foi alçada a cidade em 1700, ficou famosa pela linha da estrada de ferro que a ligava a Minas, eternizada na música de Milton Nascimento. O motivo da nossa escala na cidade é que eu já tinha passado por lá a mais de dez anos, e tinha saudade da cidadezinha acolhedora e próspera .
Nessa última década e meia a cidade parou no tempo, literalmente, não só pelo encolhimento econômico, mas uma série de fatos motivaram o abandono proposital da cidade, o primeiro deles é recente, mas que já vinha sendo tramado há anos: a criação da RESEC (Reserva de Extrativismo controlado), homologada em julho do ano passado com a presença do presidente da república, mas por trás desse pseudo-preservacionismo o que vi é uma realidade totalmente diferente.
A reserva tecnicamente seria para preservar os mananciais de água potável, o manguezal e a vegetação nativa, mas o que tem lá hoje é uma extensa e agressiva cultura de eucaliptos, que subsitituiram praticamente toda a vegetação nativa.
Aliado a isso, um prefeito que não se sabe se por maldade ou incompetência foi incapaz de imprimir uma dinâmica econõmica e um planejamento estratégico para ao menos aproveitar o status da cidade estar dentro de uma reserva, o comércio fechado em pleno sábado dava pistas que algo está muito errado.
Lendo algumas matérias na imprensa depois que cheguei em casa descobri que a Petrobrás pretende explorar petróleo a 50km de Abrolhos, isso já foi contestado no MPF, que proibiu a estatal de levar adiante o projeto, mas todos sabemos que onde entra o dinheiro, ainda mais do petróleo, pouca coisa pode impedir.
O mais assustador é ver os caminhões de madeira indo e vindo do porto perto da Barra de Caravelas, o lugar está totalmente descaracterizado, de lá partem balsas carregadas de toras, não sei para onde elas vão provavelmente para virar carvão para a siderurgia, já que no Brasil boa parte das florestas foi consumida para fazer aço, já que não temos jazidas de carvão de qualidade.
A impressão que eu tenho é que vão transformar a cidade em entreposto petrolífero/madeireiro, uma outra estrada que liga a BR-101 mais ao Sul, antes de Teixeira de freitas, está sendo terminada para que os caminhões tragam a madeira cortada para o porto fluvial.
Com isso a necessidade de se afastar olhares curiosos, de turistas e preservacionaistas, a região não está perto o suficiente dos grandes centros, mas estrategicamente pode se tornar um ponto de exportação e importação, o que destruiria a pequena cidade colonial e toda a sua cultura e tradição. Temo que a ganancia travestida de progresso atropele as poucas cidades que ainda guardam a sua histórai como maior riqueza que possuem.
As imagens falarão mais que as palavras:
Como já tinha dito antes, o atual prefeito ou é muito incompetente ou age de má fé, tirando a condição do comércio prosperar e de quebra a própria cidade vai se esvaziando, se hoje ela está conservada é porque está abandonada, e a impressão que se tem é que alguém está se aproveitando disso, ou para desvalorizar as terras já que com a RESEC há uma série de restrições ao uso do solo, que inclusive tirou da região o cultivo de caranguejos em fazendas, o que daria renda para boa parte dos moradores ribeirinhos. Mas parece que isso não afeta a exploração dos eucaliptos, árvore consome grande quantidade de nutrientes do solo, além de água, e como a região é de manguezal com um farto lençol freático elas se adaptaram bem, talvez alguma variação genética para aguentar o solo salobro, e na rotação de cultura quando as árvores são arrancadas, o gado entra com a sua pastagem extensiva, isolando os núcleos de mata nativa que por lei são obrigados a manter, mas que em vez de corredores se tornaram ilhas cercadas com mourões e arame farpado.
A situação na prefeitura é grave, na época que estivemos lá já tinham entregado o cargo, a secretaria de turismo, o secretario de planejamento e o de obras, ninguém consegue trabalhar com o atual prefeito. Lendo os jornais locais pela web, vi a declaração do prefeito dizendo que agora ele ia começar grandes obras na cidade, gostaria de acreditar, mas na verdade acho é que a madeireira "comprou" a cidade, com todo mundo dentro, e agora faz um trabalho de sufocamento economico para que todo o movimento do turismo vá para outras cidades, deixando as estradas livres para seus caminhões de madeira, no rastro deles virão os pecuaristas com seu gado de criação extensiva, e os especuladores, comprando terras a preço de banana, já que com a limitação de uso do solo restringe o plantio a praticamente a subsistência. A falta da presença do governo, e principalmente, a falta de inciativa da prefeitura local em acompanhar o processo de avanço econômico que vi em praticamente todas as cidades que passei, lembrando que em 2007 fiz uma viagem semelhante, e a impressão que tive foi de melhoria substancial na maioria delas.
Caravelas é um caso trágico de imcompetência e oportunismo, que está acontecendo longe dos olhos do grande público, um lugar distante mais de 400km da capital mais próxima é o palco perfeito para se instalar mais uma sinecura com o beneplácito e o investimento do dinheiro do governo.
Barra de Caravelas - As Embaixadas
Mas nem tudo é tristeza, passando por Barra, vi a pequena igreja, consagrada também a São Sebastião, esta sim aberta, enfeitada, cheia de gente lá dentro assitindo a missa. Em uma das faixas, dobrada pelo vento, podia se ler " Salve São Sebastião, que lutou até a morte e não temeu as ameaças dos ímpios", era uma mensagem clara ao massacre que a população vem sofrendo, e junto com a sua fé resiste ao assédio.
As Embaixadas são uma das tradições mais antigas do cristianismo, ela remonta a guerra entre mouros e cristãos nas cruzadas e em todo país elas estão presentes, em Caravelas ela tem um sabor especial, porque lá é onde ela é representada a mais tempo, praticamente desde de a fundação da cidade e da criação de sua primeira ermida ou capela, com certeza naqueles tempos já se encenava a guerra entre o bem e o mal, e nada mais simbólico agora no momento em que eles estão vivendo.
Um pouco de vídeo também, é a história é contada por si mesma:
A preparação:
O desafio:
A batalha, nessa hora a camera avisou que tinha acabado o cartão de memória, tive que trocá-lo às pressas, mas ainda deu pra gravar alguma coisa:
A vitória, os cristãos com a imagem de São Sebastião à frente expulsam os mouros.
Prado e Alcobaça
Depois desse mergulho na história deu fome, seguimos então para Prado, do outro lado da restinga que forma as três cidades.
Um vídeo da entrada da cidade, detalhe aos 45 segundos do vídeo, um outdoor comemorando a compra de uma retroescavadeira com os recursos da municipalidade, o que msotra quão difícil é manter essas pequenas cidades com um mínimo de recursos.
Se realmente a exploração de petróleo vingar na região a cidade será a principal beneficiada, e segundo soube, vários moradores apostam nessa promessa, a especulação imobiliária começa a aparecer, e além de explorar o eco-turismo também esperam o dinheiro das empresas petrolíferas.
Não consigo entender que lugares tão bonitos são praticamente abandonados. Muito difícil ver coisas assim, no litoral aqui no sul. Qualquer lugar onde tenha areia é bastante disputado.
ResponderExcluirOS BAIANOS CONHECEM POUCO O BOM DA BAHIA. HA QUEM PREFIRA MORA EM FAVELAS NAS CAPITAIS. A GANANCIA NO EXTREMO SUL DA BAHIA ZELA DE IDEIAS OLIGÁRQUICAS E DESPREZA O BEM COMUM. OS FORASTEIRO DÃO MAIS VALOR PORQUE ESTÃO FORA DESSES REGIMES.
ExcluirUma região muito bonita mesmo. Aproveitei minha estada em Porto Seguro para conhecer as cidades de Prado, Alcobaça, Teixeira de Freitas, e a linda Vila Guaiú. Uma beleza!
ResponderExcluirMUITO BONITO A CIDADE DE CARAVELAS E PONTA DE AREIA EU FUI LÁ NA DECADA DE 80 E NO CARNAVAL DE 97, NOSSA OLHANDO AS FOTOS TA MUITO ABANDONADA A CIDADE
ResponderExcluirCOM O CRESCIMENTO DAS CIDADES DO INTERIOR DO EXTREMO SUL DA BAHIA, TEIXEIRA, M NETO, POSTO DA MATA, EUNÁPOLIS E OUTRAS DE MINAS, O LITORAL FICOU POUCO SEDUTOR PARA QUEM QUERIA CRESCER NA VIDA.
ResponderExcluirMuito bacana sua página! A parte mais triste é o abandono de Ponta de Areia. Acho que a prefeitura de Caravelas errou muito ao deixar a estação e o pátio da ferrovia desaparecerem. Se tivessem sido mantidos intactos, seriam visitados por muitas pessoas no nordeste de MG, que tinham a E. F. Bahia-Minas como referência. Acho até que, como SP está fazendo com Paranapiacaba, o distrito poderia tentar conseguir uma nomeação de Patrimônio da Humanidade. Agora... tudo perdido...
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