sábado, 19 de fevereiro de 2011

dia 5 - Ponta de Areia

O blog anda meio devagar porque essa foi a "semana do tranco", leia-se: Pegar no tranco pra voltar à normalidade do dia-a-dia. Mas agora vou manter as postagens mais frequência, até porque ainda faltam uns 10 dias DESSA viagem, depois contarei outras, pra trás e as que virão pra frente.

Caravelas foi fundada em 1503, sendo uma das mais antigas ocupações da colônia, foi alçada a cidade em 1700, ficou famosa pela linha da estrada de ferro que a ligava a Minas, eternizada na música de Milton Nascimento. O motivo da nossa escala na cidade é que eu já tinha passado por lá a mais de dez anos, e tinha saudade da cidadezinha acolhedora e próspera .

Nessa última década e meia a cidade parou no tempo, literalmente, não só pelo encolhimento econômico, mas uma série de fatos motivaram o abandono proposital da cidade, o primeiro deles é recente, mas que já vinha sendo tramado há anos: a criação da RESEC (Reserva de Extrativismo controlado), homologada em julho do ano passado com a presença do presidente da república, mas por trás desse pseudo-preservacionismo o que vi é uma realidade totalmente diferente.

A reserva tecnicamente seria para preservar os mananciais de água potável, o manguezal e a vegetação nativa, mas o que tem lá hoje é uma extensa e agressiva cultura de eucaliptos, que subsitituiram praticamente toda a vegetação nativa.

Aliado a isso, um prefeito que não se sabe se por maldade ou incompetência foi incapaz de imprimir uma dinâmica econõmica e um planejamento estratégico para ao menos aproveitar o status da cidade estar dentro de uma reserva, o comércio fechado em pleno sábado dava pistas que algo está muito errado.

Lendo algumas matérias na imprensa depois que cheguei em casa descobri que a Petrobrás pretende explorar petróleo a 50km de Abrolhos, isso já foi contestado no MPF, que proibiu a estatal de levar adiante o projeto, mas todos sabemos que onde entra o dinheiro, ainda mais do petróleo, pouca coisa pode impedir.

O mais assustador é ver os caminhões de madeira indo e vindo do porto perto da Barra de Caravelas, o lugar está totalmente descaracterizado, de lá partem balsas carregadas de toras, não sei para onde elas vão provavelmente para virar carvão para a siderurgia, já que no Brasil boa parte das florestas foi consumida para fazer aço, já que não temos jazidas de carvão de qualidade.

A impressão que eu tenho é que vão transformar a cidade em entreposto petrolífero/madeireiro, uma outra estrada que liga a BR-101 mais ao Sul, antes de Teixeira de freitas, está sendo terminada para que os caminhões tragam a madeira cortada para o porto fluvial.

Com isso a necessidade de se afastar olhares curiosos, de turistas e preservacionaistas, a região não está perto o suficiente dos grandes centros, mas estrategicamente pode se tornar um ponto de exportação e importação, o que destruiria a pequena cidade colonial e toda a sua cultura e tradição. Temo que a ganancia travestida de progresso atropele as poucas cidades que ainda guardam a sua histórai como maior riqueza que possuem.

As imagens falarão mais que as palavras:

Os caminhões nunca param, nem sábado nem domingo.

Uma placa anuncia uma balança para controle da carga.

Aí está ela, apenas um pavimento de concreto no meio do nada.

Esse é o estado da placa de boas vindas da cidade.






Ruazinhas estreitas com casas simples, a cidade não tem sequer um prédio de mais de dois andares.

O porto, agora vazio, antes saveiros e lanchas aguardavam os passageiros para Abrolhos.

Algumas embarcações que me pareceram ser da Marinha, eram barcos de serviço com certeza.

Dando a volta pela beira do rio, antes havia uma amurada aqui, foi tudo descaracterizado.

O centro da cidade continua o mesmo, aqui a praça principal com a igreja de Santo Antônio, padroeiro da cidade, mas estranhamente sua festa estava acontecendo em Barra de Caravelas, que vou mostrar adiante.

O casario encontra-se preservado, mas com sinais de desuso, a cidade parece abandonada.

Um pequeno Cristo igual ao do Corcovado abraça a praça vazia.

De novo pelas ruas estreitas, quase ninguém apenas um cavaleiro solitário.

Uma pequena capela

A rodoviária, pelo tamanho dá pra imaginar a importância que a cidade teve no passado, porque além do trem daqui partiam ônibus para as cidades próximas levando os passageiros e carga. Esta parece ser a antiga estação de Caravelas, que era chamada "Central", a de Ponta de Areia foi demolida nos anos 80 e nada sobrou dela, procurei pela cidade, em algum ponto ainda tinha da antinga plataforma de embarque, mas nada sobrou. Tudo porque o prefeito na época, temendo pelo tombamento da velha estação devido à música de Milton nascimento, deu ordem para que os moradores retirassem todo o material de construção que lehs interessasse, e deixou o resto desabar com o tempoo, uma lástima, fotos desse crime hediondo contra a história do país podem ser vistas aqui: http://www.estacoesferroviarias.com.br/baiminas/ponta.htm

Como sempre a Camara dos Vereadores sempre parece mais bem cuidada que a própria prefeitura, pelo visto os nobres edis devem passar seus finais de semana bem longe da cidade, a considerar como as coisas funcionam no Brasil acredito que estejam todos muito satisfeitos com o abandono em que Caravelas se encontra hoje.

Ponta de Areia é a parada seguinte, praticamente colada a Caravelas, era até onde o trem ia, o único resquício é a Praça dos Ferroviários, iniciativa de um morador que montou esse pequeno memorial, já que a prefeitura resolveu esquecer o lugar, que aliás, me pareceu mais limpo e arrumado que a sede do município, fruto do capricho dos moradores, mutos ex-ferroviários, que tristes vêem a história da cidade aos poucos ser esquecida.

Nessa praça ficava a estação demolida, pelo menos alguém teve o bom senso de lembrar que ali foi como diz a música "onde Minas encontra o mar".

Conversando com os moradores descobri que o descaso com a cidade é grande, a pelo menos duas administrações municipais a economia do município vem em processo de decadência, e não é só isso, cidade próximas como Alcobaça hoje se apresentam como "Portal de Abrolhos", título que antes era de Caravelas.

Como já tinha dito antes, o atual prefeito ou é muito incompetente ou age de má fé, tirando a condição do comércio prosperar e de quebra a própria cidade vai se esvaziando, se hoje ela está conservada é porque está abandonada, e a impressão que se tem é que alguém está se aproveitando disso, ou para desvalorizar as terras já que com a RESEC há uma série de restrições ao uso do solo, que inclusive tirou da região o cultivo de caranguejos em fazendas, o que daria renda para boa parte dos moradores ribeirinhos. Mas parece que isso não afeta a exploração dos eucaliptos, árvore consome grande quantidade de nutrientes do solo, além de água, e como a região é de manguezal com um farto lençol freático elas se adaptaram bem, talvez alguma variação genética para aguentar o solo salobro, e na rotação de cultura quando as árvores são arrancadas, o gado entra com a sua pastagem extensiva, isolando os núcleos de mata nativa que por lei são obrigados a manter, mas que em vez de corredores se tornaram ilhas cercadas com mourões e arame farpado.

Chegando em Barra de Caravelas, o aspecto ao redor da estrada parece mais familiar ao que vi tempos atrás, ainda há alguma preservação e o que se vê à volta são apenas coqueiros e algusn sítios, nenhuma exploração extensiva, apesar de já estarmos sobre a área de mangue, percebe-se uma secura de alguns baixios que antes eram cheios dágua, sinais que a cultura do eucalitpo já está secando o lençol freático que abastece essas bacias de água doce.

A entrada de Barra de Caravelas, nesse trecho da estrada fica a entrada do porto de embarque da madeira, uma estrada corta por dentro do que seria uma reserva e o manguezal, trazendo os caminhões direto para cá sem atravessar a cidade.

Aqui o rio encontra o mar, já não estamos em águas abrigadas, mas o mar é tão calmo que nem parece.

O Hotel Marina Porto Abrolhos, onde estive em 1996, hoje ele está quase fechando, vi alguns carros lá dentro e alguns hóspedes, mas parece que ele só abre alguns meses por ano, não há mais procura, uma pena.

Ponta da Areia ficou para trás aqui acaba a estrada, e Herbie não estava de pneus adequados pra ficar andando na areia fofa.

O lugar é muito bonito, mas parecia tão vazio apesar de ser domingo e dia de sol, era como se as pessoas tivessem ido embora, eu me lembrava dessa praia bem mais cheia e praticamente sem lugar pra parar.

A situação é tão complicada que até o pouco comércio que tenta subsistir lança mão de artifícios, a dona dessa loja onde paramos para comprar algumas lembranças me disse que a loja que fica na cidade fica fechada durante o verão e que ela abre essa loja em Barra só três meses por ano.

A situação na prefeitura é grave, na época que estivemos lá já tinham entregado o cargo, a secretaria de turismo, o secretario de planejamento e o de obras, ninguém consegue trabalhar com o atual prefeito. Lendo os jornais locais pela web, vi a declaração do prefeito dizendo que agora ele ia começar grandes obras na cidade, gostaria de acreditar, mas na verdade acho é que a madeireira "comprou" a cidade, com todo mundo dentro, e agora faz um trabalho de sufocamento economico para que todo o movimento do turismo vá para outras cidades, deixando as estradas livres para seus caminhões de madeira, no rastro deles virão os pecuaristas com seu gado de criação extensiva, e os especuladores, comprando terras a preço de banana, já que com a limitação de uso do solo restringe o plantio a praticamente a subsistência. A falta da presença do governo, e principalmente, a falta de inciativa da prefeitura local em acompanhar o processo de avanço econômico que vi em praticamente todas as cidades que passei, lembrando que em 2007 fiz uma viagem semelhante, e a impressão que tive foi de melhoria substancial na maioria delas.

Caravelas é um caso trágico de imcompetência e oportunismo, que está acontecendo longe dos olhos do grande público, um lugar distante mais de 400km da capital mais próxima é o palco perfeito para se instalar mais uma sinecura com o beneplácito e o investimento do dinheiro do governo.


Barra de Caravelas - As Embaixadas

Mas nem tudo é tristeza, passando por Barra, vi a pequena igreja, consagrada também a São Sebastião, esta sim aberta, enfeitada, cheia de gente lá dentro assitindo a missa. Em uma das faixas, dobrada pelo vento, podia se ler " Salve São Sebastião, que lutou até a morte e não temeu as ameaças dos ímpios", era uma mensagem clara ao massacre que a população vem sofrendo, e junto com a sua fé resiste ao assédio.
As Embaixadas são uma das tradições mais antigas do cristianismo, ela remonta a guerra entre mouros e cristãos nas cruzadas e em todo país elas estão presentes, em Caravelas ela tem um sabor especial, porque lá é onde ela é representada a mais tempo, praticamente desde de a fundação da cidade e da criação de sua primeira ermida ou capela, com certeza naqueles tempos já se encenava a guerra entre o bem e o mal, e nada mais simbólico agora no momento em que eles estão vivendo.






Um pouco de vídeo também, é a história é contada por si mesma:

A preparação:



O desafio:


A batalha, nessa hora a camera avisou que tinha acabado o cartão de memória, tive que trocá-lo às pressas, mas ainda deu pra gravar alguma coisa:


A vitória, os cristãos com a imagem de São Sebastião à frente expulsam os mouros.



Prado e Alcobaça
Depois desse mergulho na história deu fome, seguimos então para Prado, do outro lado da restinga que forma as três cidades.

No caminho ás margens do rio, barcos.

O centro de visitantes do Parque de Abrolhos, fechado para almoço, fiquei devendo a visita.

A estreita ponte que leva a Prado

A entrada da cidade, toda colorida, aliás, ela se apresenta como "a cidade mais colorida do Brasil".

Bem legalzinha, com seus paralelepípedos irregulares e o colorido do casario.



Um vídeo da entrada da cidade, detalhe aos 45 segundos do vídeo, um outdoor comemorando a compra de uma retroescavadeira com os recursos da municipalidade, o que msotra quão difícil é manter essas pequenas cidades com um mínimo de recursos.

Procurávamos um lugar para almoçar,e achamos

Enquanto o prato não vinha, fui dando uma olhada nos lugares por onde já tínhamos passado, esse guia de praias da 4 rodas foi visionário, em uma época que nem se sonhava com Google Earth ela montou um guia a partir de imagens de satélite, ele foi muito útil durante toda a viagem.

E chegou o rango, uma panelada de peixe, camarão, lagosta e eteceteras deliciosa, valeu a espera.

Aliás, o lugar compensava a demora, uma praia belíssima.

De volta pra Alcobaça, passando por nossos "amigos" eucaliptos.

De vez em quando uns ciclistas treinando passavam por nós.

Obras na rua principal que leva à praia, em frente ao farol, quando ficar pronta esse será o cartão-postal de Alcobaça.

A exemplo de Prado e Caravelas, uma cidade tranquila.

Com ruas estreitas

Praças

Igrejas

Uma praia com uma orla urbanizada, apenas aguardando os turistas

Parada para tomar um sorvete, de frutas da região é claro

Enquanto a tarde vai alongando as suas sombras

Devidamente ensorvetados, seguimos pela orla em direção ao hotel

O farol de Alcobaça, e funciona sim , automatizado, com uma pracinha em volta.

O "Pimenta de Cheiro", se preparando para mais uma noite.

Isso é a praia depois do farol, rua de terra, de um lado a praia do outro a cerca, uma imensa área protegida.

O Hotel onde ficamos, novo e com instalações bem funcionais, na faixa de R$ 140,00 a diária para casal, com um monte de coisas, pisicna, sauna, bar, uma boa opção de hospedagem.
Se realmente a exploração de petróleo vingar na região a cidade será a principal beneficiada, e segundo soube, vários moradores apostam nessa promessa, a especulação imobiliária começa a aparecer, e além de explorar o eco-turismo também esperam o dinheiro das empresas petrolíferas.

E com essa imagem fechamos o dia em Alcobaça, amanhã, mais para cima pela Costa do Descobrimento.

6 comentários:

  1. Não consigo entender que lugares tão bonitos são praticamente abandonados. Muito difícil ver coisas assim, no litoral aqui no sul. Qualquer lugar onde tenha areia é bastante disputado.

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    1. OS BAIANOS CONHECEM POUCO O BOM DA BAHIA. HA QUEM PREFIRA MORA EM FAVELAS NAS CAPITAIS. A GANANCIA NO EXTREMO SUL DA BAHIA ZELA DE IDEIAS OLIGÁRQUICAS E DESPREZA O BEM COMUM. OS FORASTEIRO DÃO MAIS VALOR PORQUE ESTÃO FORA DESSES REGIMES.

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  2. Uma região muito bonita mesmo. Aproveitei minha estada em Porto Seguro para conhecer as cidades de Prado, Alcobaça, Teixeira de Freitas, e a linda Vila Guaiú. Uma beleza!

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  3. MUITO BONITO A CIDADE DE CARAVELAS E PONTA DE AREIA EU FUI LÁ NA DECADA DE 80 E NO CARNAVAL DE 97, NOSSA OLHANDO AS FOTOS TA MUITO ABANDONADA A CIDADE

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  4. COM O CRESCIMENTO DAS CIDADES DO INTERIOR DO EXTREMO SUL DA BAHIA, TEIXEIRA, M NETO, POSTO DA MATA, EUNÁPOLIS E OUTRAS DE MINAS, O LITORAL FICOU POUCO SEDUTOR PARA QUEM QUERIA CRESCER NA VIDA.

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  5. Muito bacana sua página! A parte mais triste é o abandono de Ponta de Areia. Acho que a prefeitura de Caravelas errou muito ao deixar a estação e o pátio da ferrovia desaparecerem. Se tivessem sido mantidos intactos, seriam visitados por muitas pessoas no nordeste de MG, que tinham a E. F. Bahia-Minas como referência. Acho até que, como SP está fazendo com Paranapiacaba, o distrito poderia tentar conseguir uma nomeação de Patrimônio da Humanidade. Agora... tudo perdido...

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